terça-feira, 12 de maio de 2015

ESCOLA DE LEITORES

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ESCOLA DE LEITORES

Data de publicação: 11/05/2015
Por Irene Paz   
Ilustração André Neves - do Livro a Menina que Contava, de Fábio Monteiro - Paulinas Editora

O desafio de formar um País de leitores competentes não pode ficar só por conta das editoras de livros de literatura infantojuvenil

A última Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, divulgada em 2012 e encomendada pelo Instituto Pró-Livro, aponta que o brasileiro ainda tem pouco apego aos livros: lê, em média, quatro volumes por ano, enquanto nos países da Europa o índice está na casa de oito por habitante. O levantamento ainda apontou que apenas 88,2 milhões de pessoas, equivalentes a cerca de 50% da população com cinco anos ou mais, podem ser consideradas leitoras. Também houve uma queda de aproximadamente 8% em relação à pesquisa de 2008, na qual foram constados 95,6 milhões de leitores. Mudanças de metodologias à parte promovidas na pesquisa pelo instituto Ibope Inteligência, os resultados não são para comemorar. Ou desanimar. Isto porque o País se preocupa em formar novos leitores. Brasileiros de 5 a 17 anos já representam cerca de 40% do total de leitores, e o segmento da literatura infantojuvenil é um dos mais promissores do mercado editorial, com um crescimento anual por volta dos 10%.
Com menos de um século de vida no Brasil – tendo como marco inaugural a obra Narizinho Arrebitado, publicada por Monteiro Lobato em 1921 –, a literatura infantojuvenil até que não demorou a se tornar um próspero filão na indústria livreira. Hoje, perto de 120 editoras se dedicam a publicar livros para crianças e jovens que já têm acesso a 30 mil títulos. Onde? Pergunta incômoda, pois a rede de livrarias no Brasil não condiz com seu tamanho e, para constrangimento geral, ainda encolhe. Entre 2011 e 2012, o número de livrarias caiu de 3.481 para 3.073 segundo a Associação Nacional de Livrarias (ANL). Menos mal que o e-commerce se firma dia a dia e um novo fenômeno cultural desponta no País, com a multiplicação de feiras, festas e salões literários. O melhor exemplo é a Festa Literária Internacional de Paraty (RJ), a Flip, que até gerou uma versão dedicada às obras e autores infantojuvenis, a Flipinha. Em 2014, a Flip atraiu mais de 20 mil pessoas e, este ano, entre 1º e 5 de julho, irá para sua 13ª edição.

Qualidade e quantidade – No Brasil, uma das razões de a literatura infantojuvenil ostentar números de gente grande reside no fato dela, em certa proporção, ser produzida com reconhecido esmero. No ano passado, por exemplo, o ilustrador brasiliense Roger Mello ficou com o Prêmio Hans Christian Andersen, tido com o Nobel da Literatura infantojuvenil. Atribuída pelo Conselho Internacional sobre Literatura para os Jovens a autores de literatura para a infância e juventude, a premiação aconteceu em março, durante a Feira do Livro Infantil e Juvenil de Bolonha (Itália), a maior e mais importante feira de negócios do segmento no mundo. E não foi a primeira vez que o Brasil chegou lá. Anteriormente, as autoras Lygia Bojunga e Ana Maria Machado já haviam vencido na categoria escritor em 1982 e 2000, respectivamente. 
Ao lado dessa qualidade está, muitas vezes, a quantidade, provando que, quando se quer, é possível adotar uma política de massificação da cultura sem maiores prejuízos. “Todas as nossas escolas públicas hoje têm livros de literatura, por compras de governos ou de projetos, e os nossos professores se preocupam muito mais com a formação leitora das crianças”, garante a pedagoga e secretária-geral da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) Elizabeth Serra. Segundo ela, por incrível que pareça – leia-se: em um tempo de crescimento das mídias eletrônicas –, o livro em papel, em especial o feito para crianças e jovens, ocupa cada vez mais espaço. “Não devemos temer as novas mídias, mas ter equilíbrio. Se as crianças só tiverem tablets e celulares, sem oportunidade de conviver com o livro em papel, aí sim teremos um desequilíbrio. Os pais e educadores devem saber balancear”, recomenda Elizabeth.

Temática variada – “Ainda que a circulação dos e-books inevitavelmente venha a crescer, as crianças nunca ficarão sem livros impressos, sobretudo os livros-objetos. As mídias caminharão juntas. Afinal é agradável para elas experimentarem o sentido tátil do papel”, concorda a irmã Maria Goretti de Oliveira, editora responsável pela área infantojuvenil de Paulinas Editora, que tem disponíveis cerca de 450 títulos no segmento – a editora lança, em média, 12 títulos por ano – ou praticamente 25% do seu catálogo. Também ali a quantidade é acompanhada de qualidade, pois muitos de seus títulos foram distinguidos com o Prêmio Jabuti, oferecido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL); o selo Altamente Recomendável FNLIJ, oferecido pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil; ou mesmo adotados por diferentes secretarias municipais e estaduais de Educação para distribuição nas suas redes escolares, quando não pelo Ministério da Educação (MEC). 
“É importante trabalhar com vários temas, como meio ambiente, valores, cidadania e questões sociais, e certificar-se de que o original tem real valor literário. Aqui nenhum autor é publicado sem aprovação do Conselho Editorial e de assessores, mestres e doutores em Literatura”, revela irmã Maria Goretti. Um desses autores é a psicanalista e mestra em Literatura Comparada Ninfa Parreiras, uma ativa defensora do gênero. “Também creio em uma integração entre mídia digital e livro impresso, não em uma substituição. O status da literatura precisa ser mantido para a história ser contada; e o poema, lido. Assim você entra num mundo de mistério e surpresa, e comanda a viagem. Abrir um livro, tocar as páginas, ler, reler, parar e voltar. Isso é mágico!”, pontua a autora de, entre outros, Histórias d’além Mar, para quem as ilustrações podem ser poderosas aliadas. “Tivemos, sim, uma melhoria na parte gráfica, na concepção editorial do livro, com ilustrações mais ricas, que proporcionam outra linguagem além do texto”, explica. 

Leitores competentes – Mas engana-se quem imaginar que a palavra esteja a serviço da ilustração ou esta esteja a serviço da palavra. Na literatura infantojuvenil, mais do que em qualquer outra, ambas se prestam a estimular a imaginação de um leitor às vezes em formação. “Considero o livro uma obra onde a palavra e a imagem dialogam numa narrativa e convidam o leitor a uma experiência simbólica por uma história marcada por nuances poéticas. Palavra e imagem estão ali para contar uma boa narrativa, com toda a potencialidade e criatividade que o leitor merece”, aponta o coordenador pedagógico Fábio Monteiro, autor de A Menina que Contava (Paulinas Editora, 2013) e Cartas a Povos Distantes, a ser lançado este ano pela mesma editora. Ambos, não por acaso, têm o mesmo ilustrador – André Neves –, como para provar a necessidade de uma simbiose entre palavra e imagem. “É sempre uma satisfação quando encontramos um ilustrador que se adapte a um autor. No caso de Fábio e de André houve um encontro perfeito”, admite a irmã Maria Goretti. 
O resultado de casamentos felizes entre palavras e imagens pode ser conferido em suas crias: bons livros infantojuvenis e, sobretudo, leitores competentes. Mas não adianta se iludir: estes últimos não surgem se, do outro lado de quem produz livros de qualidade com tanto trabalho e talento, não existirem formadores de opinião criteriosos. “Nós precisamos de professores, críticos especializados e pais que ajudem o leitor em formação a fazer escolhas que extrapolem os modismos e que apontem para uma reconhecida qualidade na narrativa, imagens e produção gráfica”, propõe o autor Fábio Monteiro. O desafio de formar um País de leitores, como se vê, não pode, literalmente, ficar só no papel ou muito menos numa tela.
https://www.paulinas.org.br/familia-crista/?system=news&id=10152&action=read



Fonte: FC ediçao 952-ABRIL- 2015
Postado por: Família Cristã

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